quinta-feira, 21 de maio de 2015

APRENDENDO A DISCERNIR IV


Então, percebi que não era Deus quem o enviara; tal profecia falou contra mim, porque Tobias e Sambalate o subornaram. Neemias 6:12.
O verbo perceber, neste texto, tem o sentido de discernir. Aqui Neemias foi bem habilitado por Deus para discernir uma profecia de Semaías, um falso profeta, muito sutil e camuflado, que foi contratado pelos adversários de Israel, a fim de levar o reconstrutor da cidade, Neemias, a pecar contra Deus, e, em seguida, ser acusado de infâmia.
Eis a profecia falsa: Vamos juntamente à Casa de Deus, ao meio do templo, e fechemos as portas do templo; porque virão matar-te; aliás, de noite virão matar-te.Neemias 6:10b. Eles queriam envolver Neemias em covardia, levando-o à fuga de seu posto de trabalho e ao sacrilégio, fazendo-o entrar no templo, como um rebelde.
Só os sacerdotes poderiam entrar no templo, segundo a ordem bíblica. Assim, se alguém que não fosse sacerdote entrasse no santuário cometeria sacrilégio. Neemias era um homem piedoso e sabia da proibição, logo, pôde discernir o embuste.
Assim como Neemias pôde perceber que Semaías era falso profeta, ainda que a mensagem fosse de cuidado e de proteção para com ele, nós também, precisamos de acuidade nesse quesito. Nada que nos garanta proteção e, ao mesmo tempo, nos leve a desobedecer os mandamentos e princípios da Palavra de Deus, merece crédito.
Os falsos profetas e os mestres enganadores são muito semelhantes aos que falam a verdade. A melhor fraude é aquela que se parece com o que é autêntico. Satanás se disfarça de anjo de luz para poder enganar os desavisados, assim como o humanismo assemelha-se ao cristianismo, a fim de iludir os tolos que sempre caem em suas farsas.
Houve muitos falsos profetas no meio do povo de Israel, bem como, há muitos falsos mestres no contexto da igreja. Assim como, no meio do povo, surgiram falsos profetas, assim, também, haverá entre vós falsos mestres, os quais introduzirão, dissimuladamente, heresias destruidoras, até ao ponto de renegarem o Soberano Senhor que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina destruição. 2 Pedro 2:1.
No cristianismo, falso é tudo que minimiza o valor da pessoa e do sacrifício de Cristo Jesus. Quando os nossos méritos, por menores que sejam, se misturarem, ainda que, em proporções ínfimas com a obra perfeita e suficiente de Cristo, então, estamos em plena disseminação das perversas heresias destruidoras.
Uma das principais táticas do inferno é introduzir sutilmente pregadores sábios, de boa reputação e bem quistos, no seio da igreja, para pregar o que o povo quer ouvir. É por isso que agora quero ressaltar o que disseJohn Henry Newman: - o falso pregador é alguém que precisa dizer algo; o verdadeiro pregador é alguém que tem algo a dizer.
Como podemos discernir um falso mestre do legítimo? Primeiro, tem que ver se o que ele ensina é bíblico. Todavia, aqui, ainda há riscos. Uma verdade bíblica, usada fora do contexto, pode ser muito perigosa. Satanás usou as Escrituras para tentar a Jesus. Na boa hermenêutica não basta ser bíblico; precisa conformar-se com a interpretação sob o foco da pessoa e obra de Cristo. O Antigo Pacto tem que se afinar com o Novo Pacto.
O filósofo inglês Francis Bacon deu uma pista interessante: A prosperidade é a bênção do Antigo Testamento; a adversidade é a bênção do Novo. A chamada teologia da prosperidade perde a sua força quando analisada à luz das tribulações advindas da cruz.
É falso todo ensino que imuniza os crentes dos sofrimentos. Uma das legítimas características da fé cristã é a perseguição. Mas não estou falando daquela que é fruto da provocação de gente fanática e inábil ao se relacionar com os que pensam diferente.
A Bíblia é clara ao dizer: De fato, todos aqueles que querem viver uma vida dedicada a Cristo Jesus serão perseguidos. (2 Timóteo 3:12 VFL). A piedade nunca é bem vista pelos ímpios e, impiedosamente, serão os piedosos perseguidos até a morte.
Alguém disse: a perseguição é um dos sinais mais seguros da autenticidade do cristianismo. As lutas nos levam a depender de Altíssimo. Talvez, por isso, Horatius Bonar tenha visto esse grande perigo em relação ao êxito:no dia da prosperidade temos muitos refúgios aos quais recorrer; no dia da adversidade, somente a um.
As doutrinas humanistas são, muitas vezes, semelhantes às cristãs, embora as suas motivações sejam a glória dos seus praticantes. Fazer filantropia é até bem parecido com a beneficência do cristianismo, a questão está nos galardões. Todas as vezes que eu e você fizermos algo em favor do próximo, é bom perguntar: para quem vai a glória?
Na minha limitadíssima compreensão, desde que o viver cristão seja, não mais eu, mas Cristo, então, o galardão do crente fica por conta do quanto esse crente viveu na total dependência da suficiência de Cristo, neste mundo. Se galardão depender do mérito humano, não será pela graça; se for pela graça, nunca será uma conquista humana, mas um dom da graça na vida dos dependentes da graça plena.
Uma vez que a fé cristã vem de Deus, se desenvolve por Deus e vai para Deus - então, não há espaço para o humanismo. Paulo acreditava que a ação do ser humano já regenerado dependia da ação de Deus nele. Pois Deus é quem trabalha em vocês para que desejem e realizem as coisas que lhe agradam. (Filipenses 2:12-13 VFL).
O humanismo teve o seu princípio no Jardim do Éden, tendo a serpente como o treinador de um principado que propõe tornar o ser humano como Deus. O que move a alma do pecador é sua distinção, importância, glória, grandeza e todas as formas que, no íntimo, tentam nos elevar à condição de autossuficientes e meritocratas.
O cristianismo tem a ver com o esvaziamento de Deus até chegar ao Calvário. A história do cristianismo é a descrição do quebrantamento produzido pela cruz e, nunca a exaltação de um ser humano. Foi por isso que J. Furman Miller disse: “Crucificado"é o único adjetivo definido pelo qual se descreve a vida cristã.
Os falsos mestres sempre prometem uma vida de paz e prosperidade, aqui e agora. Eles põem a isca da vida próspera e atraem o povo interesseiro e imediatista, que quer viver neste mundo como se fosse o Jardim do Éden, antes da queda.
Porém, no cristianismo de Cristo, a paz de Deus e a real prosperidade da alma encontram-se nos corações dos filhos, após serem justificados pela morte e ressurreição com Cristo, embora, frequentemente, isso acabe provocando uma perseguição do mundo contra esses pacíficos justificados, detentores da paz de Cristo.
Como propõe Lionel Fletcher, o cristianismo é o caminho da cruz... teu sangue e suor possivelmente irão misturar-se aos de Cristo antes que tua vida termine. A paz de Cristo não quer dizer a paz com o mundo a qualquer preço. Nenhum redimido pode aviltar o preço da redenção negociando a sua alma com os prazeres transitórios do pecado.
Neemias não teve dúvida. A profecia era falsa, de fato. Semaías, em nome dos cuidados pessoais, queria defender a pele de alguém, transgredindo os mandamentos de Deus. Mas, a temperatura adequada da fé é a mesma das fornalhas ardentes.
A fé cristã não é pesada. Ninguém precisa ser um estivador. Não há concurso de Mister Mundo no histórico da Igreja de Cristo. Todavia, não existe cristianismo fácil. Se é fácil, não é cristianismo; se é cristianismo, não é fácil. Jesus foi muito claro: No mundo, vocês vão passar por aflições; mas tenham bom ânimo; eu venci o mundo. João 16:33b. Se seu cristianismo for confortável, está comprometido, disse J Blanchard.
As lutas, tribulações e sofrimentos são partes da experiência autêntica daquele que anda com o Senhor. Como ensinava A. W. Tozer, a Bíblia tem muitas coisas a dizer sobre o sofrimento, e grande parte delas é animadora. Com isso, não quero dizer que a fé seja uma questão louca de sadomasoquismo, mas de saber que não há cristianismo light.
Jesus, no mínimo, foi honesto ao afirmar: se me perseguiram a mim, também perseguirão a vocês.João 15:20b. Essa "teologia" que propõe sucesso em tudo aqui no mundo, show pirotécnico, ausência de sofrimento e competição para ver quem é o melhor no pódio, contraria a pregação do evangelho. O cristianismo é a manifestação da cruz.
Babel é a escada mais eminente do humanismo para tornar um nome célebre. Por isso, todo cristão precisa da cruz, no dia a dia, a fim de esvaziar-se da pretenção de se projetar no cenário. Assim, o lugar mais seguro para se viver é no porão escuro, fora da platéia e longe de ser um espetáculo de talentos, mas como uma testemunha da fé.

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